Ex-prefeitos do ABC paulista são condenados por nepotismo cruzado

Hahn Scherer
Hahn Scherer

A ausência de justificativa plausível para as nomeações de filha e cunhada de prefeitos para cargos públicos nas cidades administradas inversamente pelos respectivos parentes, somada à inespecificidade das funções desempenhadas, revelam dolo dos gestores na prática denominada nepotismo cruzado.

Com esse entendimento, a 8ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo deu provimento ao recurso de apelação do Ministério Público que pleiteou a condenação, por improbidade administrativa, dos ex-prefeitos Luiz Marinho e Carlos Alberto Grana, respectivamente de São Bernardo do Campo e Santo André, bem como de suas parentes.

Os réus foram condenados a pagar, cada um, multa civil no valor de seis vezes a última remuneração recebida. Eles também não poderão, no prazo de 12 meses, contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por meio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários.

Por não vislumbrar dolo dos prefeitos e reconhecendo que as suas parentes possuíam qualificação para o exercício dos cargos aos quais foram nomeadas, a juíza Ida Inês Del Cid, da 2ª Vara da Fazenda Pública de São Bernardo do Campo, absolveu os quatro réus. A sentença foi prolatada no dia 16 de setembro de 2021, motivando o MP a recorrer.

Relator da apelação, o desembargador Bandeira Lins assinalou não haver dúvidas da nomeação das servidoras e da relação de parentesco com os prefeitos à época dos fatos. “Nada sugere que as nomeadas possuíssem qualificação ou experiência que, objetivamente, pudessem ter sido consideradas na seleção de cada qual para os postos que ocuparam.”

Segundo o julgador, os réus sequer mencionaram a realização de eventual processo que, mesmo sem a formalidade de um concurso, “houvesse procurado oferecer critério meritório para as nomeações, de forma a que se pudesse afirmar que essas atenderam a efetivo interesse público”.

Os desembargadores Antônio Celso Faria e José Maria Câmara Junior seguiram o relator. Segundo o acórdão, não ficou explicado como as parentes ofereceram os seus serviços ou como os prefeitos concluíram que ambas seriam as pessoas mais aptas a suprir necessidades da gestão de cada um deles. “Configurada se acha, portanto, a hipótese do inciso XI, do artigo 11, da Lei de Improbidade Administrativa (8.429/1992)”.

Ajuda mútua
O MP ajuizou ação civil pública alegando que a filha de Grana, então prefeito de Santo André, foi nomeada em 22 de abril 2015 ao cargo de “técnico operacional Secom 12”, em São Bernardo do Campo. Após quatro meses, em 7 de agosto de 2015, a cunhada de Marinho, chefe do Executivo de São Bernardo do Campo, foi nomeada para o cargo de “assessor de gabinete I SG”, em Santo André.

Os municípios são vizinhos e ficam na região do ABC paulista. Segundo o MP, as indicações recíprocas das parentes dos prefeitos para os cargos de confiança caracterizaram “flagrante transgressão aos princípios da impessoalidade e moralidade, bem como em violação ao enunciado da Súmula Vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal, configurando nepotismo cruzado”.

O artigo 11 da LIA descreve as condutas consideradas atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da administração pública, por violarem os deveres de honestidade, imparcialidade e legalidade. O nepotismo é previsto no inciso XI e, assim como a Súmula 13 do STF, abrange o “ajuste mediante designações recíprocas” nas nomeações de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau.

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